domingo, 25 de março de 2012


Sorocaba, dia 19 de Março de 2012

Mãe,
Depois de tanto tempo brincando de ser adulto, acabei (sem me dar conta disso) incorporando esses valores miseráveis que o mundo dos grandes me colocou goela a baixo, como aquele prato de feijão que você insistiu que eu comesse, quando o que eu queria mesmo era só brincar.
É mãe, jamais te culparei por isso, faria o mesmo no seu lugar, porque, na verdade, a minha maior referência de gente grande é a senhora... Mas mesmo assim, sinto que algo estranho me distanciou do meu percurso: é como se as regras das minhas brincadeiras favoritas se tornassem leis severas e que ser grande me obrigasse a abandonar a minha personalidade.

Quando eu brincava, não havia espaço para certo ou errado, todos tinham um papel bem definido, mas ninguém era punido por esquecer uma regra; porém, sem perceber, cada deslize era observado pelos adultos, e ao passo que crescia, as outras crianças começaram a imitar essa estranha mania de julgar, e esse julgamento, esse julgamento moral, mãe, é algo tão agressivo que passei a ter medo de ser eu mesmo.

E em tão pouco tempo, deixei os meus sonhos mais absurdos, abandonei minhas brincadeiras, parei de cantar e de dançar, porque o mundo se dividiu, e só podia ver o certo e o errado, o medo de estar do lado errado era tão grande que decidi ser como os adultos que me cercam.
É estranho, Mãe. Eu costumava ter medo do escuro, hoje tenho medo das coisas que as luzes podem me mostrar, pouco a pouco construí um castelo com aquele emprego que você disse que iria dar dinheiro, mas nesse castelo a única coisa que reina é a solidão.

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